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Reflexão do Evangelho – Domingo, 05 de julho

Reflexão do Evangelho

Domingo, 05 de julho

Mt 11,25-30 – Evangelho revelado aos simples

Ao redor de Jesus, os discípulos formavam um grupo itinerante, que passava de vilarejo em vilarejo, escalando os declives da estrada, muitas vezes, sob um sol causticante. O olhar do Mestre lhes dava força, ânimo; Suas Palavras incutiam-lhes confiança: “Haverá alguém dentre vós que, se o filho lhe pedir um pão, lhe dará uma pedra? Ou, se lhe pedir um peixe, lhe dará um escorpião?” (Lc 11,11).    

Certa feita, emocionado, Jesus exclama: “Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste essas coisas aos sábios e poderosos e as revelaste aos pequeninos”.  Para o Pai, não importa o passado pecaminoso de alguém; essencial é o hoje, possibilidade de um futuro. O seu desejo é revelar a Verdade do Filho, que veio para salvar a todos, introduzindo-os na intimidade da vida divina. Dom precioso, fruto do amor do Pai! 

Maravilha! Pedro o recebeu e o expressa numa bela e perene profissão de fé: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”. Mas, os que se julgam “sábios e poderosos” poderão acolher Aquele que é generosidade, perdão, misericórdia? Parecem impenetráveis à mensagem do Filho. Porém, Ele insiste, não desiste…

Santo Agostinho, em suas interrogações espirituais, sente-se surpreso ao ouvir a descrição de Jesus, a respeito de sua missão: “Eu vim não para ser servido, mas para servir”. Fascinado, ele exclama: “Este é o meu Deus! A quem os soberbos resistem, e os humildes acolhem. Por Ti suspiro! Que eu possa trilhar o caminho da humildade, e conhecer-Te sempre mais!”. Alegria total! Eis a resposta, tão ardentemente, buscada! É simples, está ao alcance de todos: basta acolher, como Jesus, a condição terrena, a “humilitas”.

“Pequenino”, Agostinho transfere sua vida interior, de modo pleno e livre, para as mãos bondosas e misericordiosas de Deus. O caminho para chegar a Deus passou pelo encontro consigo mesmo, pelo reconhecimento de uma existência pessoal e pela experiência de uma liberdade, que o tornou, no amor, sempre mais humano, no relacionamento com todos.

 Ele se retira para o deserto, para o silêncio da oração e da contemplação. Em si mesmo, ele encontra compreensão, perdão, paz. E, com coração sereno, passa a tratar a todos com sabedoria e misericórdia.

Agostinho sente um abraço, no dizer do salmo, o abraço do Pai!

+Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm

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Reflexão do Evangelho – Domingo, 15 de setembro

Reflexão do Evangelho

Domingo, 15 de setembro

Lc 15,1-3.11-32 – Deus, Pai misericordioso

Pai misericordioso, solícito, pronto a perdoar e acolher, em sua inesgotável bondade, os pecadores arrependidos. Mas, como isso ecoa em nossos ouvidos! Amor infinito… Direito de as pessoas se abraçarem como irmãos e irmãs? Aí começa a se realizar o Reino de Deus… Início de um mundo novo!

Jesus nos ensina a viver, a amar, a perdoar. E nós, quais cidadãos do Reino, percebemos a proximidade concreta de Deus e alcançamos nossa autêntica realização como pessoa humana.

Essas palavras são ilustradas por Jesus, através da parábola do filho pródigo. Breve história de um jovem, que esbanjou, totalmente, em terras distantes, o que tinha recebido em herança.

Se, no primeiro momento, tudo era agradável, alegria, logo depois, terminado o dinheiro, nada tinha para se sustentar… Mesmo a comida dos porcos lhe era recusada… Pensa no lar, no pai… No fundo do seu coração, forte arrependimento: “Ah! Quem sou eu?”. Uma nova esperança! Voltarei para junto do pai…

Ao longo do caminho, o canto dos pássaros, o silêncio… Mil coisas soam aos seus ouvidos, seu coração acelera… O que dizer ao pai? Sim, prostrar-se a seus pés! Pedir-lhe perdão!

Ainda distante, divisa a casa paterna… sua casa… À porta, pelo modo de se apoiar nos batentes, o pai… Este, ao reconhecê-lo, vem ao seu encontro… correndo… Abraça-o, reveste-o de roupas novas, coloca em seu dedo o anel de família. Ele se esforça para dizer algo… balbucia… Mas a misericórdia do pai tudo supera.

A emoção de ambos é enorme! Sem moralizar, sem prescrever normas, o pai o acolhe e o conduz ao aconchego do lar. E, diante da reação áspera, dura do filho mais velho, ele diz: “Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu. Era necessário fazer festa, porque esse teu irmão estava morto e reviveu, tinha-se perdido e foi encontrado”.

Dirá o grande escritor Tertuliano: “Seu filho, perdido e reencontrado, tornava-se mais querido, pois reencontrado”. E conclui: “E um pai, mais pai que Deus, não há. Tu que és seu filho, saibas que mesmo após ter Ele te adotado, se tu O abandonas e voltas nu, Ele te receberá. Ele se alegrará ao te rever”.

+Dom Fernando Antônio Figueiredo,ofm

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Reflexão do Evangelho – Domingo, 27 de janeiro

Reflexão do Evangelho

Domingo, 27 de janeiro

Lc 1,1-4; 4,14-21 – O sentido da vida cristã (Jesus em Nazaré)

De modo eloquente, o Evangelho fala da restauração do sentido da vida humana, mediante o sacrifício do egoísmo. Porém, o mesmo Evangelho não deixa de ressaltar que possuímos um valor integral e uma dignidade insofismável. Criados à imagem e semelhança de Deus, trazemos a marca indelével da bondade e do amor divino.

Sem abolir a sua transcendência, Deus é uma presença, que, desde a criação, nos impele a uma progressão inexaurível, no curso da qual, mais e mais, chegamos à verdade de nós mesmos.

Portanto, é inconcebível pensar que o mal do egoísmo esteja em não se valorizar a si mesmo; ele reside, precisamente, no fato de não atribuir aos outros o mesmo valor e respeito que temos para conosco. O egoísta afirma ser tudo, na tentativa de reduzir os outros a nada.

Vale lembrar as palavras insistentes do Mestre, ao nos comunicar o amor, cujo potencial de realização exige comunhão, igualdade, solidariedade. Como missionário do Pai, Ele deseja iluminar todos os seres humanos, transmitindo-lhes, mais que a luz da razão e da consciência de si, a luz interior, com seu duplo efeito: impedir que permaneçamos reduzidos à individualidade, e possamos viver como pessoas humanas, que se realizam no dom de si mesmas.

Eis a natureza humana resgatada e renovada na Pessoa do Filho de Deus feito homem!

A noção de pessoa humana, que se realiza na medida em que ultrapassa sua natureza comum, implica, sem dúvida, sua participação na vida divina. Soam aos nossos ouvidos as palavras do Mestre: “Amai-vos uns aos outros, como eu vos amei: amai-vos assim uns aos outros” (Jo 13,34).

Em Nazaré, embora estivessem admirados da sabedoria de seus ensinamentos, seus conterrâneos permaneciam incrédulos, perguntando-se: “Como conseguiu tanta sabedoria? E esses grandes milagres que são realizados por suas mãos? Este homem não é o carpinteiro, filho de Maria? Ficaram escandalizados por causa dele”. E escandalizar-se, segundo o Evangelho, é o oposto de “crer em alguém”.

Eles se fecham à sua Palavra, consideram-no como um estrangeiro em sua Pátria. Razão pela qual Jesus não realiza milagres em Nazaré, mas apenas algumas curas, “para não se pensar, escreve S. Ambrósio, que Ele fosse constrangido pelo amor à pátria”. Por isso, diz S. Cirilo de Jerusalém: “Doravante, Jesus se reporta aos pagãos, que o acolherão e serão curados de sua lepra”.

+ Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm

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Reflexão do Evangelho de segunda-feira 29 de agosto

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Reflexão do Evangelho de segunda-feira 29 de agosto

Mc 6,17-29 – Morte de João Batista

A atividade de João Batista situa-se “no deserto”, lugar de oração e recolhimento, mas também, na linha de interpretação do Êxodo, lugar de conversão e de um novo início na caminhada para a vida eterna, fim destinado por Deus a todos os seres humanos.  Daí seu estilo de vida simples e austero, sem propriedade, vivendo do que o deserto lhe fornecia: gafanhotos e mel silvestre; vestindo pelos de camelos com um cinturão de couro rude. Com a audácia de um eremita, queimado pelo sol, João é o profeta, que largando tudo, vivia em função do futuro, anunciando a vinda do Messias.

O relato de sua morte é uma espécie de prelúdio à missão redentora de Jesus, à sua morte na cruz, como cumprimento dos desígnios de Deus. Muitos autores apontam semelhanças entre os dois: ambos foram profetas e ambos testemunharam a verdade, trazendo esperança e conforto aos espíritos ávidos de consolo e de paz, ao preço de sua própria vida.  A expectativa messiânica recorda o hino composto pelo Dêutero-Isaías, que descreve a passagem de um cortejo pascal por um deserto, que se transforma, diante da face do Senhor, num jardim florido. À frente, conduzindo-o, vem um arauto que prepara os que se encontram ao longo do caminho para receber aquele que avança. O arauto, muitos diziam que era João Batista, assassinado por ordem de Herodes; e “aquele que avança e tudo renova” era Jesus, que foi entregue a Pôncio Pilatos por seus adversários, e, após, levado à morte.

Às margens do rio Jordão, João Batista prega a penitência, anuncia profeticamente o juízo final e declara aos doutores da Lei que o fato de serem filhos de Abraão não era garantia de salvação: ele os convoca a produzir frutos dignos de conversão, de arrependimento, pois dizia: “Já o machado está posto à raiz das árvores e toda árvore que não produzir bons frutos será cortada e lançada ao fogo”. Sua mensagem sobre o juízo compreende a oferta do batismo a todos, também a Herodes, que se colocava acima da lei. Núncio do Messias, com sua imperturbável convicção profética, ainda em liberdade, ele prefere afrontar o ódio do rei, em vez de negar os mandamentos de Deus apenas para adulá-lo. Na verdade, apesar de ter sido aconselhado por João a deixar o pecado do adultério, porque Herodes vivia em concubinato com a mulher do próprio irmão, o rei preferiu livrar-se do homem que o advertia de seu erro. Efetivamente, observa São Pedro Crisólogo: “A virtude torna-se indesejável para aqueles que são imorais; a integridade é motivo de sofrimento para os corruptos; a misericórdia é intolerável aos cruéis”.

Os últimos momentos da vida de João Batista são descritos por Orígenes como sendo os de um profeta que morreu com a certeza de dever cumprido: “João reprovava Herodes com a liberdade de um profeta. Levado à prisão por causa disso, não temia a morte, mas somente pensava no Messias que ele tinha anunciado. E não podendo ir ao seu encontro, envia dois de seus discípulos para interrogá-lo: ‘És tu aquele que deve vir? ’. Os discípulos retornam, relatando ao seu mestre o que o Salvador tinha dito. Então, João, armado para o combate, morre com segurança”. Como não podia deixar de ser, o profeta morria como viveu: dando testemunho da justiça e da liberdade do amor.

Dom Fernando Antônio Figueiredo,OFM

Ressurreição de Jesus – futuro antecipado

Ressurreição de Jesus – futuro antecipado

        Com a morte do Senhor, o desalento toma conta dos discípulos, que se perguntam: “Por que tinha Ele morrido de modo tão ignominioso, na flor da idade? Será que era, de fato, o Messias, o Salvador, em quem tinham acreditado?”.

Mas eis que algumas mulheres, dentre elas Madalena, foram ao túmulo para homenageá-lo, e retornaram anunciando que lá nada tinham encontrado. Imediatamente, os dois Apóstolos, Pedro e João, correram ao local do sepultamento para verificar o que tinha acontecido. Felizes, voltaram dizendo que O tinham encontrado, não morto, mas ressuscitado! Dirá São João Crisóstomo: “Ninguém chore pelos próprios pecados, porque o perdão emergiu do túmulo”.  

Ressuscitado, Jesus traz a realidade da sua presença entre aqueles que lhe são fiéis. Porém, sua ressurreição não se encerra num determinado momento da vida dos discípulos; repercute, capacitando-os e fortalecendo-os para que, conscientes da presença do divino Mestre, expressem sempre mais a eficácia da justiça e do amor.

Cumpre-se o desejo dos que estão esperando o auxílio de Deus: a divina compaixão, impulso incentivador de um tempo futuro, visto como antecipação do final dos tempos.  

Se João Batista anunciava o juízo iminente, convocando os pecadores à conversão, agora, com a ressurreição do Mestre, é indispensável deixar que o coração e a mente se decantem, como uma água tranquila, na certeza da ação salvadora de Deus. Ao longo da missão pública, Jesus se alegrava e se solidarizava com os pecadores, os rejeitados pelas autoridades judaicas e os desprezados pela opinião pública, dizendo certa feita: “Os sãos não têm necessidade de médico, mas os doentes sim. Não vim chamar justos, mas pecadores” (Mc 2,17).

Se os justos têm sua mansão na casa de Deus (Lc 15,31), Jesus quer que os pecadores sejam tratados como irmãos, concedendo-lhes perdão e, ao lembrar que o próprio Deus demonstra amor por todos eles, estende a exigência positiva da reconciliação ao preceito de “não matar”.  Assim, estejam os discípulos sempre prontos a perdoar seus semelhantes, sem colocar barreiras nem medidas (Mt 18,21).

O amor é o poder último, o futuro definitivo, já decidido por Deus, que, ao ressuscitar o Filho Jesus, anunciou sua irrupção, como a mais ampla ação salvadora da justiça para judeus e gentios. Ele nos permite entender as palavras do Mestre Eckhart: “O olho com o qual eu vejo Deus e o olho com o qual Deus me vê são um só olho, um só, o mesmo”.

Eis o fundamento sobre o qual se edifica o Reino de Deus, instaurado por Jesus ressuscitado, o anunciador do amor.

          Felicitações! Em Cristo ressuscitado, esperança, vida nova!

+ Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm

Celebração Pascal – 2021

Celebração Pascal – 2021

No monte das Oliveiras, Jesus ora. Não longe dele, “à distância de um arremesso de pedra”, os Apóstolos dormem. Já se ouvem, descendo de Jerusalém e subindo o monte, os passos dos soldados… 

Prostrado em terra, “Jesus ora com mais insistência ainda e o suor se lhe tornou semelhante a espessas gotas de sangue que caíam por terra”. A morte é pressentida como iminente.

Levantando-se, vai aos discípulos, como que à procura, escreve Pascal, “de companhia e conforto da parte dos homens”. Triste, aflito, espera pela solidariedade dos três Apóstolos: Pedro, Tiago e João, que, tomados pelo cansaço, se deixaram vencer pelo torpor do sono. Simplesmente lhes diz: “Dormi agora e repousai”.  Sente-se só. E é sozinho que Ele enfrentará a sua hora.

Ao retornar à oração, dos seus lábios brotam murmúrios de uma alma aflita: “Abba, Pai, se possível afaste de mim este cálice”. Sente a fraqueza natural da morte, porém, ao contrário de Adão, Ele exclama: “Pai, não se faça o que eu quero, mas sim o que tu queres… Não a minha vontade, mas a tua”. Abandona-se ao amor do Pai, força que lhe permitirá afrontar e vencer a morte.

Súbito, o alto da colina se ilumina e um apressurado grupo de soldados aproxima-se, portando tochas acesas. À frente, conduzindo-os, Judas, que, após beijá-lo, saúda-o: “Salve, Mestre!”.  Nenhuma reprimenda… apenas um último apelo: “Amigo, para que estás aqui? Com um beijo entregas o Filho do homem”. Tomados de pânico, os discípulos se dispersam. Seguem-no de longe, como é o caso de Pedro e João.

Arrastado, vilipendiado, Jesus é levado pelos soldados e deixado na prisão. É o início da paixão, que culminará com a crucifixão.

Elevado na cruz, seus olhos não se turvam, doces e serenos, voltam-se para seus algozes; sua voz, entrecortada de dores, supera as zombarias dos acusadores: “Pai, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem”. Seu semblante reflete ternura e bondade.

Seu olhar se volta para a Mãe, e, com o amor e a reverência que Ele lhe dedicou durante trinta e três anos, diz ao discípulo amado, presença de todo verdadeiro discípulo: “Eis tua Mãe”, e para sua Mãe: “Eis teu filho”. Maria o abraça, afago materno.

Por volta das três horas da tarde, após dizer: “Pai, em vossas mãos entrego o meu espírito”, com voz forte, brada: “Tudo está consumado”. A terra treme, fendas aparecem nos rochedos e o centurião, que ouvira as suas últimas palavras, exclama: “Na verdade, Ele era o Filho de Deus”.

Elevado na cruz, Ele atrai todos a Ele. A Lei não é abolida. Plenamente, ela se realiza na vida dos que acolhem Sua herança espiritual. Se a Lei condena matar, roubar, eles a superam, vão além, assumem a atitude de amar e de respeitar até seus próprios inimigos.

Exclama Santo Agostinho: “O aeterna Veritas, et vera Caritas, et cara aeternitas, Tu es Deus meus!”  Através dos tempos, ele é “o Doutor da Caridade”; para outros, o Doutor da Verdade”. De fato, ele é um e outro, realmente associados. No seu agir, no seu pensar, na sua profissão de fé, Agostinho associa sempre a verdade e a caridade, luzes que emergem da Revelação e penetram sua alma até o mais íntimo, onde Deus reside sem nela se encerrar.

Comemoramos a Páscoa, “passagem de Jesus deste mundo ao Pai”. A salvação e a paz descem até nós, penetram nossa vida, transformam-nos em arautos da Boa-Nova do Evangelho. Com Santo Agostinho dizemos: “Amemo-nos também nós, uns aos outros, como Cristo nos amou e se entregou por nós”.     

Unidos em oração e confiando na iniciativa misericordiosa de Deus, a todos, uma feliz e abençoada Páscoa!

+Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm.

Natal 2020

Reflexão

Abençoado Natal – 2020

Três anos antes de sua morte, no povoado de Greccio, desejoso de vivenciar o mistério do nascimento de Jesus, Francisco de Assis pede a um homem chamado João, que lhe tinha grande amizade, para preparar o ambiente da celebração. Dizia-lhe: “Quero lembrar do Menino que nasceu em Belém, os apertos que passou e ver, com os próprios olhos, como Ele ficou, reclinado no presépio, em cima da palha, entre o boi e o jumentinho”.

No dia do Natal, tudo estava preparado. Eis o primeiro presépio!

Os sinos tangem! Os irmãos, também homens e mulheres dos arredores, com tochas para iluminar a noite e recordar que o Menino, nascido em Belém, era a luz do mundo.

Ao lado do presépio, de pé, Francisco canta o Evangelho, os frades entoam hinos e louvores, anunciando as maravilhas do Menino, o Messias, o Filho muito amado do Pai celestial, que, sem deixar de ser Deus, nasceu de Maria. Exclama Santo Agostinho: “Desperta, ó homem, por tua causa Deus se fez homem!”. Aquele que é do céu veio até nós, assumiu nossa humanidade, a fim de nos comunicar as riquezas da vida divina.

Suas vozes se unem ao coro celeste dos anjos, que diziam aos pastores: “Alegrai-vos, nasceu-vos o Salvador!”, o Esplendor da luz de Deus. De braços abertos, a Criança acolhe a todos, quer saibam ou não, pois ninguém Lhe é estranho.

A pureza desse momento solene se embaça e os olhos ardentes e amorosos de Francisco, apenas o humanamente cristão, passeavam pelos participantes da celebração. O “Poverello” de Assis aprendera a ver chagas encobertas, crianças sem teto e sem pão, a tragédia íntima de famílias na miséria e desassistidas.

É Natal! O Filho de Deus nasceu de Maria, tornou-se um de nós. Abeiramo-nos do abismo do Mistério da gratuidade da vida e do amor; as trevas do pecado se dissipam e reluz a brilhante luz da esperança, prelúdio da Ressurreição!

Que a luz divina ilumine nossa vida e a de nossos familiares! Feliz e abençoado Natal! Um novo Ano, em que a verdade, presente em cada pessoa, nos conduza à adequada realidade humana da paz, da justiça e da fraternidade! 

+Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm

Reflexão do Evangelho – Domingo, 25 de outubro

Reflexão do Evangelho

Domingo, 25 de outubro

Mt 22,34-40 – O maior mandamento

Alegria, caridade, tolerância e bondade, marcam a vinda do Senhor, “um Deus que se fez homem para que o homem se tornasse Deus” (Santo Atanásio). Sua humanidade não só é semelhante à nossa, é a mesma que está em nós, de tal modo que, graças a Ele, o “novo Adão”, nos é dada a possibilidade de alcançar a realização plena e perfeita.

Ao unir, de modo indivisível, num só mandamento: “Amar a Deus e ao próximo”, o Mestre indica uma forma de vida verdadeiramente “humana”. Mais do que um mandamento, inscrito em nosso coração, ele constitui alento esperançoso, esforço criador de uma nova vida.

Aqui aparece a estrutura fundamental do ser humano. Irradiando e penetrando tudo, o mandamento do amor se manifesta em sua própria e misteriosa profundidade como fonte de unidade e de justiça, permitindo superar divisões e criar a pureza do coração. Sem deixar de amar a si mesmo, ele se sente interpelado e conduzido ao autêntico relacionamento com os seus semelhantes.

Por ser dom gratuito do Senhor, e não uma realidade estranha imposta, a resposta lógica e adequada ao duplo mandamento assume a forma de uma doação e engajamento total. Não para conquistá-lo, mas para agradecer, gratuitamente, a graça recebida.

Eis a experiência vivida por Santo Agostinho, que exclama: “Deus é mais íntimo a mim, do que eu a mim mesmo”. Ele é o sentido de uma vida, interiormente livre, para amar e servir aos seus semelhantes, na magna e profunda alegria de habitar a Terra Prometida.

+Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm

O “Poverello” de Assis

Reflexão – Domingo, 4 de outubro

O “Poverello” de Assis

Nascido na cidade de Assis, na Úmbria, Itália, em 1181, membro de uma família abastada da burguesia, Francisco, em sua infância e adolescência, desfrutou dos privilégios de sua classe social. Pensava dedicar-se aos negócios do pai, comerciante de tecidos. Porém, imbuído de outros ideais, alistou-se no exército de Gualtieri de Brienne, que combatia pelo Papa.

Acometido por uma doença, retirou-se da frente de combate e voltou a Assis, onde, num sonho revelador, ouviu o Senhor que lhe dizia: “Faz a tua doçura, das coisas amargas”.

Sente-se renovado, uma nova criatura, ciente de que “é dando que se recebe, perdoando que se é perdoado”. E, deixando o lar, enrolado em pobres farrapos, pôs-se a cantar, imprimindo no coração dos irmãos, que o acompanhavam, a mística da “perfeita alegria”, serenidade interior, ainda que na perturbante pobreza e, mesmo, no momento da morte.

Sua alma serena e generosa constituía fonte criadora de profundos laços de fraternidade e de amizade com todas as criaturas. Nenhuma lhe era indiferente. Todas as coisas lhe eram motivo de respeito e de louvor a Deus, mesmo a simples minhoca, retirada do caminho para não ser pisada pelos caminhantes.

Suas atitudes proporcionavam aos irmãos verdadeira capacidade fraternal para dialogar, cordialmente, com todos, mesmo em meio às diferenças ou posições contraditórias. A cada um, ele augurava felicidade e paz. E lá vai ele, o arauto da paz, até os Lugares Santos, onde, num fato inédito, encontra-se com o sultão Malek-al-Kamel, presente nos Lugares Santos. Ao retornar, traz a recomendação de que, em seus estados, “os frades de cordão” teriam total franquia. De fato, lá estão, até hoje, os franciscanos como custódios da Terra Santa.

Mais do que uma pessoa humilde, Francisco representava a própria humildade. Ela o possuía, conferindo-lhe brilho, sentido e grandeza. Em uma síntese harmoniosa, vivia a comunhão entre todos, que, juntamente com ele, entoavam a litania do Cântico do Sol em louvor a Deus e às criaturas.

A humildade, cada vez, diferente, simples e límpida, fruto do amor gratuito do Pai, jamais deixou de estar presente em suas palavras e atos. Nele, torna-se amor a Deus e a todas as criaturas.

+Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm

Reflexão do Evangelho – Domingo, 20 de setembro

Reflexão do Evangelho – Domingo, 20 de setembro

Mt 20, 1-16 – Generosidade do Patrão

Para além dos inúmeros preceitos jurídicos e morais, Jesus proclama a herança espiritual de Moisés, reafirmada pelos profetas: o amor a Deus na solidariedade e na dedicação misericordiosa ao próximo.

É a instauração do Reino de Deus, comparado por Ele a uma vinha, cujo dono, ao final do dia, paga aos trabalhadores, conforme a sua generosidade e não pelos resultados obtidos. De fato, segundo as orientações recebidas, o administrador dá a cada um a mesma importância, a começar pelos que tinham chegado ao final da tarde, terminando com os que tinham trabalhado o dia todo.

O objetivo é ressaltar a atitude compreensiva e bondosa do dono da vinha, pois a diária dada a cada um correspondia ao que era necessário para colocar alimento à mesa de sua família. Por outro lado, é bastante compreensível a reação de descontentamento dos que tinham chegado à primeira hora: além de terem suportado o calor do dia, trabalharam bem mais. Sob o ângulo da justiça, sentem-se lesados e injustiçados.

 Porém, a um deles, com um tom de voz suave e tranquilo, diz o proprietário: “Amigo, não fui injusto contigo. Não combinaste um denário? Toma o que é teu e vai. Eu quero dar a este último o mesmo que a ti. Não tenho o direito de fazer o que eu quero com o que é meu? Ou o teu olho é mau porque eu sou bom?”.

 Jesus assegura que a todos, nos múltiplos períodos da história da humanidade, caso trabalhem em Sua vinha, será concedido o mesmo salário: a salvação, a eterna comunhão com Deus. S. Cirilo de Alexandria observa: “A todos, que seguem o Mestre, é dada a mesma importância, a salvação, a vida feliz em Deus”.

Ele é o “princípio pessoal de unidade”, o Homem Novo, que reconcilia os da primeira hora, os judeus, com os da última hora, os pagãos, pela força do amor e não, simplesmente, pelo cumprimento da Lei ou por um princípio abstrato. Realizam-se, assim, as palavras dos profetas Isaías 3,14-15 e Miqueias 4,1-8, que apregoavam uma justa e nova redistribuição de todos os bens, feita pelo próprio Deus.

+Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm

Reflexão do Evangelho – Domingo, 13 de setembro

Reflexão do Evangelho

Domingo, 13 de setembro

Mt 18, 21-35 – O perdão das ofensas

A salvação não é apenas uma realidade futura; ela se concretiza numa forma de vida atual, que torna o homem sempre mais “humano”, e, portanto, digno de Deus. Nesse processo de realização, busca de uma identidade precisa, aberta e vivificada pelo amor, é essencial a conjunção da graça divina com a ação livre do homem, orientada para o bem.

Caso seu agir não corresponda a uma vida reta e justa, ele terá sempre a possibilidade de se corrigir, graças à consciência moral, através da qual, nas palavras do Apóstolo S. Paulo, Deus lhe fala e lhe comunica a essência da Lei, expressa no Decálogo.

Embora esta voz seja perceptível ao seu coração, corre o risco de não corresponder aos ditames de sua consciência: o amor a Deus, vivido no amor ao próximo e no serviço. Essa ruptura leva o Apóstolo Pedro a perguntar: “Senhor, quantas vezes devo perdoar ao irmão, que pecar contra mim? Até sete vezes?”.

O número sete significa totalidade. Talvez, ao dizê-lo, Pedro estivesse pensando num número elevado de vezes, o que explica a surpresa dos discípulos, quando o Mestre lhes diz: “Não te digo até sete, mas até setenta vezes sete”. Dizia um antigo ditado: “Se alguém pecar, uma, duas ou três vezes, se lhe perdoa, mas não quatro vezes. E isso até a terceira e quarta geração”.

A resposta de Jesus revela a bondade e a misericórdia do seu coração. Nele, não existe espaço para a intransigência e ideias de rancor. Fantástico! Quão importante é o perdão! Através da Sua misericórdia, o pecador, que se arrepende, recebe a graça de Deus e é impelido a chegar ao cume da santidade.  

Para melhor compreender a força do perdão, Jesus lhes conta a parábola de um rei que pede contas a um devedor, que lhe devia dez mil talentos, 50 vezes mais do que todos os impostos da Galileia e da Pereia. Quantia enorme, comparável à nossa dívida em relação a Deus. Sem poder pagá-la, o servo cai aos pés do rei e suplica-lhe: “Dá-me um prazo e eu te pagarei tudo”. Compadecido (splanchnistheis), o rei o “soltou e perdoou-lhe a dívida”.

Entrementes, aquele a quem tudo foi perdoado encontra-se com quem lhe devia apenas cem denários. Quantia irrisória. Em vez de perdoá-lo, manda “lançá-lo na prisão até que pagasse o que devia”. O fato é levado ao conhecimento do rei, que, imediatamente, revoga o perdão que lhe concedera e o entrega aos verdugos. 

Essas palavras, fonte de esperança e de vida nova, nos transmitem uma confiança inabalável no perdão e na misericórdia do Pai eterno. Em nosso coração, ressoam as palavras do Pai-Nosso: “Perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido”.

+Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm

Reflexão de Domingo – 30 de junho

Reflexão de Domingo – 30 de junho

Mt 16, 13-19 – Confissão do Apóstolo Pedro

       Um fato marcante na vida de Jesus deu-se perto de Cesareia, cidade edificada pelo tetrarca Felipe, no ano 3 a.C. Visando introduzir os Apóstolos no mistério de Sua missão, Jesus dá início ao plano de constituir a Igreja, cuja raiz e tronco é Israel, à qual ela estaria ligada.      Voltando-se para os Apóstolos, pergunta-lhes: “Quem dizem os homens que eu sou?”.  A ideia que corria, de boca em boca, apontava ser Ele “um homem de Deus” ou João Batista, ou ainda um dos profetas.

Mas vós, meus seguidores, que me acompanham e são testemunhas de minhas ações e de minhas palavras: “Quem dizem que eu sou?”. Como sempre, de modo franco e ardoroso, Pedro responde em nome de todos: “Tu és o Cristo, o Filho de Deus”.

       Momento solene e revelador. Pedro acaba de proferir uma das mais belas profissões de fé, reconhecida por Jesus como inspirada pelo próprio Pai do céu. E ao dizer-lhe: “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja”, Jesus revela ser Pedro a rocha, princípio externo de continuidade e de unidade da “qahal”, assembleia dos fiéis do Antigo Testamento, restaurada e superada pelo Messias. 

       Ao chamá-lo de “o Cristo de Deus”, o Apóstolo se reporta, evidentemente, ao Messias, compreendido como o Salvador esperado e desejado por todos os homens. Até aquele momento, talvez os Apóstolos julgassem ser Jesus um rei terreno e político. A profissão de Pedro indica-lhes que, no Mestre, se realizam as esperanças messiânicas, ou seja, a formação do Povo messiânico, cuja presença efetiva é a Igreja.

Na Igreja, sinal sacramental da unidade de Deus, a função de Pedro é essencial. Na medida em que confirma os irmãos na fé e na prática da fé, ele é presença de unidade e de comunhão, e isso sem nunca afastar-se de um constante diálogo de amor, como ele próprio atesta  no batismo de Cornélio e de sua família (At 10,1ss): a Igreja tem sempre suas portas abertas para todos.

É relevante lembrar que a mensagem do Senhor exclui toda e qualquer pretensão de uniformidade. A diversidade de costumes, ritos e, mesmo, de formulações doutrinárias confirmam e solidificam a unidade, pois ao sintetizar os contrários, em suas diferenças, a Verdade, que se impõe, confirma e fortalece a unidade. 

+ Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm

Reflexão do Evangelho – Domingo, 12 de julho

Reflexão do Evangelho

Domingo, 12 de julho

Mt 13,1-9 – Parábola do semeador

Aos olhos de Jesus, estende-se uma larga e fértil planície, cheia de luz e de vida, terra pródiga, que acolhe a semente lançada por um zeloso semeador. Não muito longe, o mar da Galileia. À sua margem, sentado, Jesus. Ao seu redor, uma multidão, que, atenta, ouvia pequenas histórias, as parábolas, extraídas da natureza e da vida cotidiana dos ouvintes.

Naquele instante, Ele narrava a parábola do semeador, cujas sementes, lançadas em terra, teriam destinos diversos, segundo a qualidade de cada terreno. Algumas, deixadas à beira do caminho, tornam-se um saboroso petisco para os pássaros; outras, em lugar pedregoso, logo secam; as que caíram entre os espinhos, comparados por São Jerônimo “aos escravos dos prazeres e dos cuidados deste mundo”, morrem sufocadas.

O enviado do Pai, seu Filho Jesus, é o missionário do amor e da paz, valores presentes no coração da história, como um germe de esperança e de luz. É algo novo, algo revolucionário: suas palavras descartam uma religião que, pela voz dos profetas, anunciava o julgamento e a salvação, como atos futuros. O Reino de Deus é uma realidade, não só iminente, mas já presente, ao alcance de todos. Impunha-se uma decisão: aceitá-lo ou recusá-lo.

O triunfo final é prefigurado pelas sementes, que, lançadas em terra boa, dão frutos abundantes, além de toda expectativa; o rendimento é vertiginoso, trinta, até sessenta ou cem “frutos por semente”.

O eschaton, momento final, vivido sob o impulso do amor, força transformadora de todo relacionamento, assegura a justiça e a paz, frutos da evolução do mundo, mas, principalmente, da ação benevolente de Deus, que antecipa, no tempo de esperança, as realidades futuras. No já agora do presente se concretiza a realidade esperada. Numa profundidade nunca vista, irrompe-se o amor divino não só criador, mas também salvador e recriador, força que abre as fronteiras, para que, juntos, possamos amar o bem e construir uma sociedade mais justa e verdadeira. 

As sementes do Logos, da razão divina, quais centelhas da Verdade, transformam o mundo, a partir de dentro, não destruindo, mas dando-lhes um novo significado, sobretudo, sob o ponto de vista social e sociocultural: um Deus que se empenha em favor dos pobres e injustiçados e o homem, que compreende a salvação, dom divino, como expressão plena de um mundo sempre mais humano, isento de dominação, no qual todos são chamados a viver como filhos e filhas de Deus, na concórdia e na caridade fraterna.

+Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm